domingo, 6 de setembro de 2015

Você tem que se derreter antes de deixar alguém te segurar.

Lembro-me de uma conversa estranha que tivemos naquele banco encardido da praça da quinta rua. Você, no auge da sua felicidade poética, pediu para que eu usasse uma metáfora para definir a mim mesma e eu, melancólica escritora que sou, prontamente respondi que era como uma pedra de gelo. Você soltou uma daquelas gargalhadas gostosas que só você tem e disse que eu era péssima com metáforas. Eu tentei me explicar, mas sempre fui melhor escrevendo do que falando. No fim, me embaralhei toda e você acabou achando graça da minha incapacidade de explicação. Você riu e eu chorei. Chorei, porque você não entendia a imensidão do frio que existia dentro de mim. Chorei, porque eu sempre magoo tudo e tudo sempre me magoa. Chorei, porque tenho uma auto aversão interna que me faz afastar todos que se aproximam. Chorei, porque você achava que eu estava exagerando, mas eu não estava. Eu não estou. Mas então você percebeu, naquela tarde ensolarada de quinta feira, eu te esperei na mesma praça de sempre, mas você não apareceu. Depois de algumas horas, você me ligou chorando, repetindo freneticamente que não dava para segurar uma pedra de gelo com as mãos nuas. Eu ri, porque você finalmente tinha entendido a metáfora, depois eu chorei também.  “Não da para segurar uma pedra gelo com as mãos nuas” você repetiu baixinho uma ultima vez antes de desligar. Não dá mesmo, respondi para as paredes descascadas da minha sala. Você tem que se derreter antes de deixar alguém te segurar.

2 comentários:

  1. Esse é um dos textos mais lindos que eu já li, sério. É aquele tipo de coisa que parece te entender tão bem que chega a assustar. Parabéns!

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  2. Estou completamente fascinada e encantada com tudo que você escreve. É de uma sensibilidade escandalosamente notável. É bom ler algo com o qual você se pega rindo quando chega ao ponto final. Eu adoro isso.
    Parabéns.

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