sábado, 19 de dezembro de 2015

Mulher já nasceu com a faixa de puta...


Mulher já nasceu com a faixa de puta. Com a pré disposição para ser puta. Com o sobrenome de puta. Quando se é adolescente, os ensinamentos para meninas são diferentes dos ensinamentos para meninos. Porque menino tem que ser “pegador” e menina tem que “se dar ao respeito”. Por que menina que não “se dá ao respeito” é o quê? Puta. Desde adolescentes já recebemos essa faixa. Desde cedo recebemos a listinha do que a mulher pode ou não pode fazer. Mulher não pode namorar cedo, por que mulher que namora cedo é o quê? Puta. Mulher não pode ter tido diversos relacionamentos, por que mulher que já transou com mais de um homem é o quê? Puta. Mulher não pode ficar gravida cedo, por que mulher que engravida cedo é o quê? Puta. Pai que cria filho sozinho é herói, mas mãe que cria filho sozinha é o quê? Adivinha, é puta. Sempre puta. Recentemente vimos o caso da  Fabíola, que teve sua vida intima ilegalmente exposta na internet. Assim que saiu o famoso vídeo, todos se encontraram no direito de serem juízes do bom comportamento e sentiram-se no direito de falar sobre a vida pessoal de alguém que nem conhecem. Vocês já pararam para pensar sobre isso? Você não conhecem a Fabíola, por que estão vocês a julgá-la então? Mas já é tarde demais, Fabíola já foi condenada e ganhou a grande faixa. O que Fabíola é? Puta, é claro. Mas e se a história fosse invertida? E se Fabíola pegasse o namorado na cama com a amiga, quem seria a culpada? A amiga, é claro. E sabe por quê? Porque mulher é tudo puta. Temos uma presidenta no país e sabe quais são os maiores xingamentos que ela recebe na internet? Adivinha, ela é mulher, então é o quê? Sim, puta. De todos os comentários que li, a grande maioria utilizava termos de cunho sexual para xingá-la, sendo que nenhum de seus escândalo diz respeito a sua vida  sexual, mas ela é mulher então já recebeu a faixa. Se fosse um homem na presidência, ele seria xingado de corrupto, ladrão, mas não de “puto” e sabe por quê? Porque só mulher carrega essa faixa. A culpa sempre recai nos ombros das mulheres, mas nunca no dos homens e sabe por quê? Porque homem é homem e mulher é o quê? Puta. Pobre das putas que tiveram sua profissão utilizada como ofensa, elas não tem nada com isso. Não inverta sua culpa nem utilize dessa desculpa. Não se ache no direito de usar o termo “puta”. Deixem as putas em paz.  A mulher nem sempre tem culpa.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

Sobre roupas e amizades que já não nos "servem" mais.

Sabe quando uma roupa não nos serve mais, mas continuamos a querer vesti-la? Quando temos aquela camiseta bonita no fundo da gaveta, aquela que já nos foi grande companhia, mas hoje não nos serve mais e mesmo assim, ainda a mantemos conosco? Às vezes isso também acontece com uma amizade. Manter uma amizade ou um relacionamento que não se encaixa mais com a gente, é como manter uma peça de roupa que não nos serve mais. Aperta, incomoda, por vezes machuca, e a gente são se sente mais confortável vestindo aquilo. Mas por algum motivo a gente continua guardando em casa, em um cantinho do guarda-roupa, esperando, mesmo que milagrosamente, que aquilo volte a encaixar perfeitamente com a gente. Inventamos muitas daquelas mentiras inocentes para enganar a nós mesmos, “talvez eu emagreça ou engorde”, “talvez eu mude o estilo”, “talvez  vire moda novamente”. Mas a grande verdade é que só porque algo encaixou perfeitamente um dia, não quer dizer que não vá ou não possa deixar de encaixar futuramente. Acho que a gente sabe, mesmo que apenas lá no fundo, quando uma coisa não está servindo mais. É triste, mas é verdade e demoramos para aceitá-la, porque é complicado explicar para nós mesmos que não é porque uma coisa deixou de servir que não gostamos mais dela. Até insistimos por um tempo, mas não vale a pena. Não adianta mudar um monte de coisa na gente só para tentar entrar em uma roupa que já não nos serve mais.

domingo, 13 de dezembro de 2015

Não deveria importar, mas importa.



Quando eu estava na sexta série, conheci um menino do primeiro ano, ele estava sentado em um canto do colégio, chorando baixinho. Eu sabia que ele era gay, embora nunca tivesse conversado com ele. Lembro-me de ter perguntado o que tinha acontecido e lembro-me também, dele ter me respondido apenas com uma palavra: “importa”. Demorou quase sete anos para eu entender o que ele queria dizer com aquilo, para eu entender que importava.

A pergunta que as pessoas geralmente fazem para mim, depois de um tempo, é: “você é gay?” E eu pergunto: “isso importa?” E elas dizem que não, só para depois eu perceber que importava. As pessoas dizem “eu não me importo com as pessoas gays”, mas você não pode querer casar, nem ter filhos, nem andar de mãos dadas na rua. Você não pode “parecer” gay e beijar em publico então, está fora de cogitação. E você sabe o porquê disso? Porque importa. Para uma grande maioria das pessoas importa.

Você já parou algum dia para olhar na internet os comentários de qualquer página que traga alguma coisa relacionada a gays? Não? Você deveria. Sim? Você já escreveu alguma daquelas coisas? Porque quando você olha para aqueles comentários, você percebe que importa. Hoje eu entendo o “porquê” daquele menino ter chorado, ele não estava chorando porque era gay, ele estava chorando porque isso importava para as outras pessoas.

É difícil entender essas coisas, principalmente quando não se é adulto ainda, é difícil contar, porque você nunca sabe se as pessoas que você ama vão se importar, mesmo que elas digam que não, às vezes elas se importam. Então você tem que aceitar a si mesmo e se perguntar o que realmente importa. É difícil, muito difícil. É difícil aceitar, contar, viver tranquilamente. É difícil compreender que, mesmo que para algumas pessoas importe, isso não muda quem você é, nem no que você acredita. Pode mudar sua visão de mundo, mas não porque você é gay e sim, porque você descobre que isso, quem você beija e com quem você dorme,  para algumas pessoas, importa. Não deveria, mas importa.



terça-feira, 1 de dezembro de 2015

O lado de cá e o lado de lá.

Ontem passeei pelo barro, subi algumas escadas, passei por algumas quebradas, fui visitar o lado denominado de lá. Já logo aviso que não sabia de nada, não subo escadas nem passo por quebradas, pois eu sou de cá. Os de lá e os de cá raramente se encontram em situações de convívio, passam batido, fingem ser apenas ruídos em uma multidão sem som. Há quem diga que os de lá, quando vêm para cá, e os de cá, quando vão para lá, são facilmente reconhecidos, são figuras marcadas que carregam nas costas o estigma de seu lugar. Os de lá aparecem muito do lado de cá, geralmente vêm trabalhar, já a gente de cá, vai raras vezes para lá, sempre para visitar ou “comprar”. Também dizem que a cor de lá é diferente da de cá, embora do lado de cá tenhamos as mesmas cores do lado de lá.  Do lado de cá chamamos de moreno, do lado de lá negro, preto, escuro. O lado de cá é elitizado, o lado de lá, pé rapado e vagabundo. Os de cá utilizam uma tal de “neve” que é comercializada no lado de lá, dizem que é ilegal, mas os de cá nunca são presos, enquanto os de lá sempre se dão mal. Os de cá apenas “consomem”, enquanto os de lá vendem a violência, os de lá sempre são os culpados e os  de cá sempre recebem clemência. Do lado de lá tem casinha de madeira com seis irmãos, do lado de cá tem mansão com dois que nunca estão. Do lado de lá tem baile, do lado de cá tem balada. Nessas horas os lados até se misturam um pouco, mas eles dizem que não é certo, pois já existe uma regra estipulada. Voltei para o lado de cá sem saber muito bem o “porque’ de toda essa diferença, os de lá não me deixavam chegar muito perto e os de cá não entendiam minha inquietação. Dizem que  os de lá, “não são o mesmo tipo de gente” que os de cá. Mas e a gente de cá, que tipo de gente é para ser diferente da gente do lado de  lá? 

Letícia Santos.