quarta-feira, 12 de abril de 2017

Foi quando eu aceitei que o “homem da minha vida” era, na verdade, uma mulher.





Quando eu tinha quinze anos, eu beijei um garoto na escola e detestei. Eu lembro bem desse dia, todas as minhas amigas falavam sobre garotos, sobre beijar garotos e eu era aquela garota, encolhida na cadeira, apavorada porque não queria crescer. Eu lembro que todas as minhas amigas me achavam infantil, porque eu não queria usar saias e vestidos curtos, ou sair com os garotos. Eu queria ser amiga deles, claro, mas qualquer coisa além disso me deixava nervosa. Crescer era assustador, sempre é, mas foi um pouco mais assustador para mim.

Eu lembro que todas as minhas irmãs costumavam falar de como seria incrível conhecer o cara certo, como um dia eu conheceria o “homem da minha vida” é muito difícil fazê-las entender que isso nunca vai acontecer e que está tudo bem, porque está tudo bem, isso nunca foi um problema para mim, mas eu sei que é para elas. Eu lembro muito bem dessas nossas conversas, porque toda vez que esse assunto surgia, eu me encolhia um pouco mais, eu me fechava um pouco mais. Naquela época eu não entendia muito bem o porquê, eu apenas sentia como se nunca realmente houvesse um espaço para mim, para ser quem eu era, para quem eu sou.

Talvez por isso eu não tenha tanta intimidade com elas hoje em dia. Eu as amo, claro, elas me amam também, mas nós não temos muito o que conversar, nós criamos essa bolha insegura que pode estourar a qualquer momento e, por mais que que no fundo eu queria que ela estoure, eu também fico apavorada com o que pode acontecer. Uma rejeição explícita é muito pior que uma que a gente finge que não existe. As pessoas dizem que um “não” é melhor que a incerteza de um “talvez”, mas isso nem sempre é verdade. Às vezes um “talvez” é o que te faz continuar tentando.

Eu nunca consegui entrar em suas conversas e elas nunca conseguiram entender o porquê de eu estar tão irritada o tempo todo. Nem eu entendia, às vezes eu ainda não entendo. É um processo muito longo aceitar que você só pode ser aquilo que é. Eu ainda lembro toda as vezes em que elas se irritaram com as minhas roupas, reclamaram do meu silêncio ou me chamaram de esquisita por eu ter uma fascinação muito maior por aquela atriz da minha série favorita do que pelo menino que morava na minha rua. Todas elas esperavam que eu gostasse de um cara, mas eu nunca gostei e acho que elas simplesmente não souberam o que fazer, elas ainda não sabem, às vezes eu também não sei. Eu queria saber.

Alguns anos já passaram desde o constrangimento inicial, e nós estamos progredindo, não está nem perto do que deveria ser, mas talvez a gente chegue lá algum dia. Eu ainda engulo algumas piadas, sorrio quando algum parente me pergunta sobre “os namoradinhos”, torço para alguma delas me “defender” e às vezes, algumas raras vezes, acontece. É um alívio. Talvez isso seja algo que todos devam saber, fica melhor. Pode não ser o melhor que você espera, mas fica melhor. Nem que seja apenas você aceitando a si mesmo. Fica melhor, eu prometo. Você ainda vai esbarrar em grandes amigos, bons professores e pessoas que simplesmente vão aceitar você sem fazer nenhuma pergunta. Fica melhor. Porque desde aquela época, até agora, mesmo com todas as implicações que isso traz, o melhor momento que eu tive comigo mesma foi quando eu aceitei que o “homem da minha vida” era, na verdade, uma mulher.

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